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A imprensa que ignora seus próprios problemas

Em tempos de pandemia por causa do novo coronavírus, tem se tornado comum na imprensa ver pautas questionando agentes públicos sobre informações referentes ao combate à doença. Trabalho normal e necessário. Há, contudo, a incoerência de veículos de comunicação não serem tão claros com o público da mesma forma que cobram clareza por parte de autoridades — e isso até mesmo para além de pautas linkadas à covid-19.

Expondo em suas páginas impressas e na home de sua versão virtual a contagem regressiva para o seu centenário, a Folha de S. Paulo acredita não ser de “interesse público” — principalmente para o seu próprio público assinante — a questão que envolve a marca, seus sócios e poder Judiciário. Ex-diretora de redação do jornal, Maria Cristina Frias abriu processo contra o irmão, Luiz Frias, a quem acusa de “operação ilegal envolvendo o UOL”. O caso não foi pauta para a Folha. Quem registrou o assunto foram veículos como Valor Econômico e Poder 360.

Para dar tom de cobrança a quem quer que seja, órgãos midiáticos deveriam ser claros em relação ao que acontece com eles mesmos

A Folha de S. Paulo ignorou — se segue ignorando — um tema que a envolve diretamente. A mesma Folha que, por meio de editoriais e colunistas, costuma enfatizar que o presidente e demais membros do governo federal têm problemas de informação.

Por falar em colunistas, chegamos ao Estadão e ao carioca O Globo. É comum ver nas redes sociais articulistas das duas publicações defendendo a campanha do #fiqueemcasa. E, sem que nenhum desses profissionais e os comandos dois dois impressos viessem a público se explicar, muita gente das duas empresas estão se vendo obrigadas a passar mais tempo em casa mesmo. Isso porque os jornais se fizeram valer da Medida Provisória (936) para reduzir jornadas de trabalho e, consequentemente, salários de seus colaboradores. Decisões tomadas mesmo diante de o Executivo federal definir a imprensa como atividade essencial para o país.

A redução de jornada, contudo, parece não ter sido de “interesse público” nas visões dos comandos do Estadão e de O Globo. Assim, os assinantes (que pagam para ler os conteúdos publicados por eles) não teve o direito de saber que ao menos os dois jornais estão, tecnicamente, enfrentando problemas. Talvez porque a imprensa, de modo geral, seja falha em noticiar seus próprios revezes. Para ela, parece ser mais simples apenas cobrar os outros. Falta, ao meu ver, a tão aclamada autocrítica entre os meios de comunicação do país.

 

Natural de São Caetano do Sul (SP), o jornalista Anderson Scardoelli soma mais de 10 anos de carreira focada na produção de conteúdo digital. Formado em jornalismo pela Universidade Nove de Julho (Uninove) e com especialização em jornalismo digital pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), permaneceu por mais de uma década no Grupo Comunique-se, onde foi de estagiário a editor sênior. Atualmente, com 30 anos, integra a redação da Revista Oeste e está à frente de seu próprio projeto de comunicação: o site Amigos de São Caetano do Sul.

 

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